No site da A AICEP (Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal) é possível encontrar alguns dados sobre a natureza e dimensão das relações comerciais de Portugal com algumas das autocracia mais opressivas e violentas do mundo:

Irão:
https://myaicep.portugalexporta.com/mercados-internacionais/ir/irao?setorProduto=-1
“Segundo o INE, o Irão foi o 148º cliente das exportações portuguesas de bens em 2022, com uma quota de 0,003%, ocupando a 144ª posição ao nível das importações (0,0%). A balança comercial de bens foi favorável ao nosso país, tendo apresentado um excedente de 1 702 mil euros em 2022. Na estrutura das exportações destacam-se as Máquinas e Aparelhos (25,6%), os Metais Comuns (21,7%), os Produtos Químicos (18,5%), os Minerais e Minérios (17,7%) e os Instrumentos de Ótica e Precisão (6,2%)”
O Irão é um país que tem procurado destabilizar o Médio Oriente usando proxies regionais como os Houthis, o Hamas e o Hezbollah para destabilizar a região. Paralelamente mantêm um regime internamente muito opressivo, especialmente sobre as mulheres e toda a forma de oposição interna. Qualquer importação deste regime financia esta opressão e estas operações internacionais de destabilização que desde 2012 já terão custado a Teerão mais de 20 mil milhões de dólares.
Qualquer exportação para o Irão, especialmente tratando-se Máquinas e Aparelhos (25,6%), os Metais Comuns (21,7%), os Produtos Químicos (18,5%), e os Instrumentos de Óptica e Precisão (6,2%) entra no tipo de produtos de uso militar secundário, ou seja, que podem e serão utilizados para a construção de armamento e de equipamentos para a repressão interna e para a agressividade externa do regime.
Em 2014, a Associação Empresarial de Portugal (AEP) “pela quarta vez nos últimos 10 meses,” orgulhava-se de “promover a oferta nacional no Irão. Entre os próximos dias 23 e 27, terá em Teerão uma missão comercial em que participarão 10 empresas, maioritariamente ligadas à fileira da construção”.
A “cooperação” foi criada em torno do Portugal-Iran Business Council que em Portugal é dirigido por um empresário com ligações estreitas à embaixada e ao regime dos Mullahs.

Cuba:
https://myaicep.portugalexporta.com/mercados-internacionais/cu/cuba?setorProduto=-1
“A balança comercial de bens foi desfavorável ao nosso país, tendo apresentado um défice de 15 milhões de euros em 2021. Na estrutura das exportações destacam-se as Máquinas e Aparelhos (25,0%), os Minerais e Minérios (23,9%), os Plásticos e Borracha (14,5%), os Metais Comuns (10,2%) e as Pastas Celulósicas e Papel (8,3%). Os principais grupos de produtos importados foram os Produtos Alimentares (72,6%), a Madeira e Cortiça (17,2%), os Produtos Agrícolas (6,4%) e os Produtos Químicos (0,1%).
Em 2022, o valor das exportações foi de 26 milhões de euros e o das importações de 46 milhões de euros, o que representou um défice do nosso país de 20 milhões de euros.”
Mas não se contabiliza aqui as receitas do turismo português em Cuba que alguns estimam serem mais de 110 milhões de euros. Isto significa que o nosso défice comercial para com o regime ditatorial cubano deve ser o maior de todas estas autocracias.
Cuba está no lugar 65º/180 no Índice de Transparência.

Venezuela:
https://myaicep.portugalexporta.com/mercados-internacionais/ve/venezuela?setorProduto=-1
“A balança comercial de bens foi desfavorável ao nosso país, tendo apresentado um défice de 6 084 mil euros em 2023. Na estrutura das exportações destacam-se os Combustíveis minerais (69,2%), os Produtos Alimentares (5,1%), os Produtos Agrícolas (4,9%), os Minerais e Minérios (3,3%) e os Produtos Químicos (3,2%).
Os principais grupos de produtos importados foram os Metais Comuns (96,8%), os Produtos Alimentares (2,0%), os Produtos Agrícolas (1,0%), a Madeira e Cortiça (0,1%) e o Vestuário (0,0%).”
Lugar 177º/180 no índice de Transparência
Neste mapa de importações surgem destacadas as importações de petróleo. De notar que a Venezuela transferiu o pagamento do petróleo que exporta para um banco estatal russo o que significa que Portugal está a transferir estas verbas para a Rússia o que significa que ao comprar petróleo à Venezuela Portugal também está a financiar a guerra de Putin na Ucrânia.

Rússia:
Embora não conste da lista do site da AICEP Portugal continua a comprar gás russo. Embora as importações nacionais de gás natural russo tenham caído 62% em 2022, voltaram a aumentar em 2023, mostra a DGEG. A Rússia ainda é o 3.º fornecedor, depois da Nigéria e EUA. De recordar que o Gás Natural continua livre de sanções e a funcionar como uma das principais fontes de financiamento da invasão russa da Ucrânia e que a União Europeia, em junho de 2024 continuava a ser (!) o maior importador de gás russo, com 54% do total, seguido da China com 22% e do Japão com 18%.

Conclusões:

A análise dos dados da AICEP sobre as relações comerciais de Portugal com o Irão, Cuba e Venezuela revela um cenário complexo e multifacetado:
1. Apesar de existirem relações comerciais com todas as nações mencionadas, o volume de negócios, em geral é relativamente pequeno quando comparado com outros parceiros comerciais de Portugal.
2. A balança comercial com a Venezuela é desfavorável a Portugal, enquanto com o Irão e Cuba há superávit.
3. As exportações portuguesas para estes países são diversificadas, abrangendo desde produtos industriais até bens de consumo.
4. O impacto directo destas relações comerciais na economia portuguesa, em termos de criação de emprego ou crescimento económico, é muito limitado.
5. A manutenção de relações comerciais com regimes autoritários coloca um dilema ético, pois materializa-se, de facto, como um apoio a práticas antidemocráticas e a violações graves e reiteradas dos direitos humanos.


Considerando as conclusões acima, propõem-se as seguintes acções:

Que o Governo de Portugal:
1. Avalie o impacto social e ambiental das relações comerciais com estes países, incluindo o respeito aos direitos humanos e do trabalho.
2. Analise a possibilidade de diversificar os parceiros comerciais, reduzindo a dependência de regimes autoritários e que essa recomendação seja anexada ao site do AICEP.
3. AICEP e CCIP devem divulgar quais são as empresas portuguesas que operam nestes mercados e estas empresas devem apresentar relatórios detalhados sobre as suas actividades, incluindo o cumprimento de padrões éticos e ambientais. Tornar públicos estes relatórios, promovendo a transparência e o debate público.
4. Estabelecer condições claras para o comércio com regimes autoritários, incluindo o respeito aos direitos humanos e o compromisso com reformas democráticas.
5. Aumentar o apoio a organizações da sociedade civil nesses países, promovendo a democracia e os direitos humanos.
6. Promover campanhas de sensibilização sobre os impactos das relações comerciais com regimes autoritários.

As relações comerciais de Portugal com regimes autoritários como Irão, Cuba e Venezuela revelam um dilema entre interesses económicos e valores democráticos. Embora o volume de negócios seja relativamente pequeno em alguns casos, a manutenção dessas relações representa um apoio indirecto às práticas opressivas e a violações dos direitos humanos. É fundamental que o governo português avalie cuidadosamente o impacto dessas relações, promova a transparência nas operações comerciais e priorize a defesa dos direitos humanos em sua política externa. A diversificação dos parceiros comerciais e o estabelecimento de critérios éticos para as relações comerciais são medidas essenciais para garantir que os interesses de Portugal não são comprometidos com a violação de princípios universais.

O MdP: Movimento pela Democracia Participativa / Movimento pela Democratização dos Partidos pediu ao AICEP a lista das empresas que importam e exportam produtos e serviços para estas autocracias mas não obteve qualquer resposta. Esta entidade respondeu que “Informamos que a AICEP promove o apoio às exportações de empresas portuguesas e o investimento estruturante para Portugal com valores acima dos 25 milhões de euros. Informa-se que não entregamos bases de dados de empresas nacionais a empresas nacionais. Sugerimos contacto com a entidade abaixo referida, para assuntos relacionados com importação”: www.ccip.pt (“Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa”) a qual, por sua vez, respondeu: “Obrigado pelo seu contato com a CCIP. Para obter as informações que solicita sugiro que contate a AICEP, entidade publica que eventualmente o poderá ajudar.”: Ou seja: A AICEP atirou para a CCIP e a CCIP atirou para a AICEP.

Se procurarmos no site da CCIP por “Irão”:
https://www.ccip.pt/pt/component/search/?searchword=Ir%C3%A3o&searchphrase=all&Itemid=141
surge a página
https://www.ccip.pt/pt/35-informacao-de-mercado/irao
mas que não tem conteúdos para além de uma frase incompleta sobre “informação de mercado”

Mas no “Plano de Acções Internacionais 2025” a CCIP omite a República Islâmica embora mencione “a criação de duas ações exclusivas para as start up portuguesas, nos Emirados Árabes Unidos e na Arábia Saudita”.

Isto significa que nem a AICEP nem a CCIP divulgam informação sobre que produtos e serviços Portugal exporta para o Irão, Cuba ou para a Venezuela.

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“A essência da democracia participativa é a participação significativa na tomada de decisões e na formulação de políticas.”
Carole Pateman
“Participação e Teoria Democrática” (1970)