Uma Campanha Autárquica 3.0 é um modelo de campanha de proximidade, participativa, ecológica e baseada em soluções concretas para os problemas locais. Este documento é disponibilizado em formato de código aberto, permitindo que qualquer movimento, partido político, grupo cívico ou candidatura independente o utilize, adapte ou melhore conforme as suas necessidades e contexto específico. Idealmente, convidamos quem o usar a referir a sua origem para que este contributo continue a ser partilhado, discutido e aprimorado coletivamente.
Inspirado nas melhores práticas de mobilização comunitária, organização local e inovação democrática, este modelo apresenta um conjunto articulado de princípios, estratégias e ferramentas que procuram aproximar a política das pessoas, tornando-a mais transparente, inclusiva e eficaz.
Princípios:
Foco no contacto directo e humano nas ruas.
Porta a porta apenas em zonas-chave e com critério de densidade populacional.
Sem outdoors nem publicidade paga com uso criativo do espaço público removendo todos os cartazes actuais e não colocando novos.
Sem eventos fechados ou formais – a Rua é o palco não as salas.
Campanha transparente, ecológica e de baixo custo.
Participação descentralizada de militantes, apoiantes e cidadãos comuns.
Campanha feita nas freguesias, com rostos locais e linguagem própria.
Campanha com valores: democracia, ecologia, justiça social e urbanismo humano.
Estratégias Práticas
1. Rua-Rua-Rua
A) Brigadas Especializadas
“Brigadas da escuta”: equipas com coletes ou caps identificativos que apenas escutam os moradores e anotam preocupações
“Brigadas do problema”: equipas temáticas (habitação, mobilidade, ambiente) com conhecimento específico que percorrem a cidade, bairro a bairro registam anomalias, apresentam propostas ou fazem pequenas intervenções no espaço público (pintar parte de uma passadeira, de um banco, recolha de lixo na rua, etc)
“Brigadas da memória”: recolha de testemunhos de lisboetas antigos sobre mudanças na cidade através de visitas a lares e IPSSs (com consentimento)
“Brigadas da juventude”: jovens que dialogam com outros jovens sobre futuro da cidade (escolas e universidades)
B) Estruturas Móveis
“Tenda da democracia”: estrutura itinerante que se monta em diferentes praças
“Biblioteca ambulante”: carrinha com livros sobre política, urbanismo e cidadania
“Oficina móvel”: espaço onde se fazem materiais de campanha com a comunidade usando apenas materiais sustentáveis
2. Porta a Porta Inteligente
A) Segmentação Estratégica
Mapeamento sociológico: uso de dados públicos (INE e outros estudos) para identificar perfis de moradores freguesia a freguesia
Horários adaptados: manhãs para reformados, fins de tarde para famílias, noites para jovens
Equipas bilingues: para comunidades imigrantes (inglês, francês, mandarim, árabe) de acordo com as especificidades de cada bairro
Abordagem geracional: jovens falam com jovens, idosos com idosos
Bicicleta com reboque: para apoio à campanha de rua
Plantação de plantas comestíveis: em caldeiras de árvores
B) Metodologias Inovadoras
“Postais do futuro”: cartas escritas à mão sobre como gostariam que fosse o bairro que são colocadas em caixas do correio
“Inquérito dos 3 minutos”: questionário rápido sobre prioridades locais
Quais são, para si, os três principais problemas da sua freguesia?(Exemplo: trânsito, limpeza, segurança, habitação, espaços verdes, transportes, apoio social, outros)
Se pudesse resolver apenas um destes problemas, qual escolheria? Porquê?
Na sua opinião, o que está a funcionar bem na freguesia e deve ser mantido ou reforçado?
O que gostaria de ver mudado ou melhorado nos próximos dois anos?
Com que frequência participa em atividades ou iniciativas locais (ex: associações, assembleias de freguesia, festas, reuniões de bairro)?
Nunca
Raramente
Às vezes
Frequentemente
Que sugestões tem para melhorar a participação dos moradores nas decisões locais?
Quer deixar algum comentário ou sugestão adicional?
“Troca de contactos”: não só dar informação, mas pedir números/emails para manter contacto (registar previamente na CNPD e destruir BD no final da campanha)
“Vizinhos recomendam vizinhos”: sistema de referências entre moradores para serem abordados pela equipa
3. Comunicação Digital
A) Presença Online Localizada
Mini-sítios por freguesia: páginas simples com programa local, contactos diretos, agenda de ações
Google My Business por bairro: presenças locais nas pesquisas do Google
Chatbots temáticos: assistentes virtuais para responder sobre habitação, mobilidade, etc.
Newsletter hiperlocal: conteúdos específicos por código postal
B) Conteúdos Interativos
“Diário da campanha”: registo diário nas redes com o que foi feito, aprendido e ouvido
Lives semanais informais: sessões regulares transmitidas das ruas ou praças
“Pergunta ao candidato”: vídeos curtos respondendo a questões enviadas por munícipes
“Antes e depois”: comparações visuais de problemas e soluções propostas
C) Viralizações Positivas
Hashtags locais
Challenges cívicos: “Mostra o teu bairro”, “Proposta em 15 segundos” (a partir da BD de propostas)
Filtros de Instagram por freguesia: com elementos visuais locais
Playlists colaborativas: música de cada bairro criada pelos moradores
Sopas de letras para campanha: pequenos livros em papel reciclado com palavras do programa eleitoral: Para lares de idosos e doações de rua.
4. Materiais de Campanha (Sustentáveis e Criativos)
A) Intervenções Urbanas Temporárias
Stencil temporário no chão: mensagens com giz líquido lavável nos passeios
Projeções noturnas: mensagens projetadas em edifícios (com autorização)
Instalações comunitárias: arte urbana colaborativa com mensagens políticas
Grafitis legais: murais em espaços autorizados sobre temas da campanha
Flyers verdes: usando apenas papel reciclado e impresso em tipografias ou casas de fotocópias das freguesias.
Entregar cartões de visita (muitos): “Se fosse algum problema diga responderemos e tudo faremos para ajudar)
Folhetos “Vote!” sem apelo directo ao Voto nem ao Partido mas explicando do que se trata enquanto Dever e Direito
Todos os folhetos: Em papel reciclado tendo impresso o seu custo exacto, a sua pegada de carbono e como será compensada
Flyers em Verso: com poemas de frases do programa eleitoral
B) Materiais Reutilizáveis
Cartazes reciclados: reutilizar materiais antigos (papelão) para criar cartazes pintados à mão
Folhetos “ziguezague”: com perguntas/respostas e linguagem acessível, dobrável para levar no bolso
Autocolantes biodegradáveis: com QR codes para vídeos locais ou microinquéritos online
Merchandising útil: lápis de madeira, blocos de notas, máscaras reutilizáveis
Microcartazes em caldeiras de árvores: Campanha com sinais das árvores do que são e de como as vamos preservar. No verso com breves mensagens políticas.
5. Mobilização Avançada (Tech)
A) Sistemas de Organização
Kits de campanha DIY: qualquer simpatizante/militantes pode descarregar online um kit completo
App de coordenação: para partilhar ações, registar contactos, coordenar equipas
Dashboard em tempo real: mapa vivo da campanha com todas as ações
Sistema de gamificação: pontos por ações realizadas, rankings de equipas
Trello (gratuito) pode ser usado para coordenar equipas, distribuir tarefas, registar contactos e acompanhar progresso. Com etiquetas e checklists, é possível criar um sistema básico de gamificação (pontos por tarefas concluídas).
Slack oferece comunicação segmentada por canais (ex: por freguesia), ideal para partilha rápida e organizada entre militantes e simpatizantes. O plano gratuito tem limite, mas é suficiente para grupos pequenos e médios.
Google Sheets + Google Forms: para registar contactos, recolher dados do terreno e calcular pontos para gamificação, com dashboards customizados via gráficos.
Google My Maps permite criar mapas interativos onde as equipas podem marcar as ações realizadas, visualizando em tempo real o avanço da campanha por freguesia.
Airtable combina base de dados e visualização em mapas e calendários, com plano gratuito que suporta equipes pequenas, podendo funcionar como dashboard dinâmico.
Kahoot! pode ser usado para criar quizzes e desafios de conhecimento político ou da campanha, incentivando a participação e premiando os melhores.
B) Formação e Capacitação a Militantes e Simpatizantes durante a campanha e pré-campanha
Bootcamps de fim de semana: formação intensiva para novos militantes
Webinars temáticos: sessões online sobre temas específicos da campanha
Mentoria local: militantes experientes apoiam os novos (cada novo militante terá um mentor)
Biblioteca de recursos: vídeos, textos, templates para auto-formação
6. Campanha Freguesia a Freguesia (Hiperlocal)
A) Compromissos Locais
“Carta de compromisso local”: com os 5 compromissos principais para cada freguesia, assinada publicamente
Orçamento participativo simulado: exercício sobre como gastariam orçamento da freguesia
Calendário de prioridades: cronograma público do que será feito primeiro
Assembleia de bairro: encontros regulares para prestação de contas
B) Ações Culturais Integradas
“Feira da democracia”: evento com música, comida e política: cada militante ou simpatizante trás algo
Colaborações artísticas locais: integrar artistas de bairro para criar murais, ilustrações ou música: pago aos artistas
“Escuta com chá”: eventos tranquilos em centros de dia, associações de moradores, escolas
Documentários colaborativos: filmes curtos sobre cada bairro, feitos com os moradores
7. Ações de Impacto Mediático
A) Performances Políticas
“Dia sem carros”: candidatura e equipa circulam só de transportes públicos/bicicleta
“Pequeno-almoço na estação”: servir café e pastel de nata em estações de metro
“Limpeza colaborativa”: equipas de limpeza em espaços públicos degradados
“Plantação comunitária”: plantar árvores em caldeiras vazias ou espaços verdes abandonados ou criar hortas urbanas em caldeiras (com sementes e terra trazida)
B) Stunts Construtivos
“Semáforo humano”: voluntários ajudam peões a atravessar em passadeiras perigosas (ver texto de opinião)
“Biblioteca na rua”: disponibilizar livros gratuitos sobre política de centro-esquerda em paragens de autocarro
“Consultório jurídico móvel”: apoio legal gratuito em mercados e feiras com advogados da campanha: especialmente dedicado a temas “habitação”.
8. Estratégias de Inclusão e Diversidade
A) Comunidades Específicas
“Noites da diversidade”: encontros com comunidades LGBTI+, imigrantes, jovens
“Domingos da terceira idade”: ações específicas para população sénior
“Sábados familiares”: atividades para famílias com crianças
“Cafés da mulher”: espaços de discussão sobre igualdade de género
9. Economia Circular da Campanha
A) Recursos Partilhados
Banco de empréstimos: equipamentos (megafones, mesas, cadeiras) partilhados entre equipas
Rede de favores: base de dados de apoiantes que podem ajudar com competências específicas
Materiais regenerativos: tudo o que é usado pode ser reutilizado ou reciclado
Parcerias locais: comércio local é apoiado com compras locais
B) Financiamento Colaborativo
Crowdfunding hiperlocal: cada freguesia financia as suas próprias ações
“Adota uma ação”: pessoas ou empresas patrocinam ações específicas
Rifas solidárias: produtos oferecidos por apoiantes para financiar campanha
Eventos de angariação: jantares, concertos, mercados organizados por apoiantes
10. Monitorização e Avaliação Contínua
A) Métricas Qualitativas
Diários de campanha: registo diário das equipas sobre o que correu bem/mal
Inquéritos rápidos: feedback imediato após cada ação
Focus groups semanais: reuniões com pequenos grupos para avaliar estratégias
Observação participante: pessoas que acompanham ações para dar feedback
B) Dados e Analytics
Mapa de influência: onde estão os apoiantes, os indecisos, os opositores
Análise de sentimentos: monitorização das redes sociais
Métricas de engagement: qual conteúdo funciona melhor em cada freguesia
Previsões eleitorais: modelos simples baseados em ações e feedback
Conclusão
Uma Campanha Autárquica 3.0 não se limita a conquistar votos – procura transformar a forma como a política é feita nas cidades. Ao propor novas formas de escuta ativa, mobilização cidadã, sustentabilidade e comunicação hiperlocal, este modelo aposta na construção de comunidades mais coesas, informadas e participativas. Acreditamos que este é um contributo útil para todas e todos os que desejam renovar as práticas políticas e reforçar a democracia local.
Está ao dispor de quem quiser continuar este caminho. Que seja usado, adaptado e replicado por quem acredita que a política deve ser feita com as pessoas, nos seus bairros, e a partir das suas realidades.

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