“Agradecemos, em nome da comunidade iraniana residente em Portugal, a oportunidade de sermos recebidos nesta reunião pelos representantes parlamentares dos partidos com assento na Assembleia da República.
Vivemos tempos difíceis para os iranianos — tanto no Irão como na diáspora. No plano interno, a população iraniana continua a ser alvo de repressão sistemática, com limitações profundas às liberdades civis, religiosas, políticas e culturais. O mundo conhece hoje, com maior clareza, o que acontece diariamente no Irão, graças à coragem de ativistas, jornalistas, mulheres, estudantes e milhares de cidadãos que têm posto em risco a própria vida para exigir liberdade e dignidade.
Dentro do Irão, a realidade é ainda mais alarmante. O país ocupa o primeiro lugar no mundo em número de execuções per capita, sendo o Estado que mais aplica a pena de morte. Esta é utilizada não apenas contra criminosos comuns, mas como instrumento de repressão política. Estudantes que ousam levantar a voz contra as políticas do governo são sistematicamente silenciados, expulsos das universidades e privados de direitos fundamentais. As formas de oposição — sejam ativistas políticos, culturais ou cidadãos comuns — enfrentam detenções arbitrárias, prisão, tortura e, em muitos casos, execução.
Para além da repressão, o regime cria deliberadamente condições de vida insuportáveis para o seu povo. As autoridades cortam o fornecimento de eletricidade e água de forma regular, obrigando os cidadãos a lutar pela sobrevivência básica e deixando pouco espaço para o envolvimento cívico ou para a resistência política. Estas dificuldades quotidianas fazem parte de uma estratégia mais ampla para enfraquecer a sociedade e suprimir a dissidência.
O problema, contudo, não se limita ao interior do Irão. A própria existência do regime da República Islâmica constitui um perigo para o mundo. Se este regime conseguir obter uma arma nuclear, seria uma catástrofe global, com consequências geopolíticas imprevisíveis. É por isso fundamental que os Estados democráticos reconheçam esta ameaça de forma clara.
A nossa mensagem hoje, no entanto, não é sobre a política interna iraniana. É sobre os cidadãos de origem iraniana que vivem legalmente em Portugal, integrados, ativos e contributivos, e que enfrentam, nos últimos anos, obstáculos administrativos e legais cada vez mais graves para manterem a sua vida com estabilidade, dignidade e ligação às suas famílias.
Entre as principais preocupações da comunidade iraniana em Portugal, destacamos:
Dificuldades no reagrupamento familiar, que impedem a visita ou permanência temporária de familiares diretos (pais, cônjuges, filhos);
Atrasos graves e bloqueios em processos de autorização de residência e renovação, com consequências para o acesso a saúde, habitação e emprego;
Falta de clareza nos procedimentos da AIMA e ausência de resposta por parte dos serviços consulares;
A possível alteração do prazo para aquisição da nacionalidade portuguesa, que poderá passar de 5 para 10 anos — medida percecionada como discriminatória e que geraria consequências retroativas injustas.
Graves dificuldades com a Embaixada de Portugal, amplamente percecionada como corrupta e disfuncional, com procedimentos pouco claros para marcação de atendimentos e falhas no cumprimento dos serviços a que legalmente está obrigada.
Estes problemas são vividos de forma direta e silenciosa por centenas de cidadãos e famílias que respeitam a lei, trabalham, estudam e contribuem para a sociedade portuguesa — mas que se veem cada vez mais numa posição de exclusão, insegurança e instabilidade emocional.
A comunidade iraniana em Portugal não é numerosa, mas é profundamente integrada e qualificada. Está presente no ensino superior, nas áreas da saúde, engenharia, investigação científica, artes e comércio. É uma comunidade discreta, mas ativa, que tem construído pontes com Portugal desde há décadas.
É nesse espírito que reforçamos a necessidade de:
Revisão urgente dos procedimentos de concessão de vistos e reagrupamento familiar para cidadãos residentes em Portugal;
Estabilização e humanização dos critérios de acesso à residência e nacionalidade, sem retroatividade;
Criação de um canal específico de escuta e resposta para comunidades provenientes de regimes autoritários, como é o caso do Irão;
Apoio claro do Estado português às forças democráticas da oposição iraniana, tal como já acontece em países como a Alemanha, o Reino Unido, a Austrália ou a Suíça (Genebra incluída), onde têm decorrido encontros relevantes da oposição no exílio.
Estes encontros têm como objetivo unir as forças democráticas iranianas em torno de uma causa comum: derrubar o regime dos ayatollahs e abrir caminho à construção de um Irão livre, plural e democrático. Portugal, enquanto Estado de Direito e membro da União Europeia, deve estar do lado certo da História, dando sinal político de que reconhece este esforço coletivo e não pactua com a opressão nem com a impunidade.
Gostaríamos ainda de destacar o valor simbólico e político do apoio do Parlamento português ao movimento “Mulher, Vida, Liberdade” — expresso no Projeto de Voto n.º 470/XV/1.ª — e agradecer esse sinal de solidariedade. É fundamental que Portugal mantenha esta postura ativa na defesa dos direitos humanos e da democracia, dentro e fora da Europa.
Infelizmente, o regime iraniano continua a dar sinais de total indiferença perante a condenação internacional. No passado dia 16 de setembro de 2025, precisamente no aniversário do assassinato de Jina Mahsa Amini, as autoridades iranianas executaram Babak Shahbazi, um prisioneiro político acusado de espionagem. Relatos independentes indicam que a sua confissão foi extraída sob tortura física e psicológica, num processo absolutamente opaco e violador dos princípios mais básicos de justiça.
Este ato brutal, praticado num dia de tão profunda carga simbólica, é um desafio direto à consciência internacional e exige uma resposta firme dos Estados democráticos.
Portugal tem uma longa história de presença no Irão e de relação com o seu povo. Sabemos que, no futuro, poderão abrir-se novas janelas de diálogo, cooperação e intercâmbio com uma sociedade que continua, apesar de tudo, viva, rica e resistente.
A nossa presença aqui é apenas um pequeno reflexo dessa resistência, e um apelo: Não deixem esta comunidade sozinha. A nossa integração e dignidade dependem também das decisões que se tomam nesta casa. Muito obrigado pela vossa atenção.”

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